Caiu em golpe? Justiça exige prova de falha bancária para garantir ressarcimento

Mesmo com prejuízo bilionário em fraudes via Pix, tribunais têm isentado bancos em casos sem falha comprovada. Advogado alerta para os cuidados e explica o que ainda gera direito à indenização

Com o aumento expressivo das fraudes digitais, que geraram um prejuízo de R$ 4,9 bilhões em 2024 apenas com golpes via Pix, segundo o Banco Central, o Judiciário tem adotado uma postura mais restritiva em relação à responsabilidade dos bancos. Embora a expectativa do consumidor seja de proteção total, decisões recentes demonstram que, sem comprovação de falha na prestação do serviço, as instituições financeiras podem ser isentas de reembolsar as vítimas.
“Há jurisprudência consolidada em diversos tribunais indicando que os bancos não têm o dever de ressarcir o consumidor quando não há falha na prestação do serviço bancário. Isso ocorre, por exemplo, em golpes nos quais o consumidor age por conta própria ao transferir valores via Pix após ser enganado por meio de contatos telefônicos, mensagens falsas, ou propostas enganosas. Em situações em que o banco não poderia prever ou impedir a operação”, afirma o advogado Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor.

Ferri cita uma decisão recente obtida por seu escritório no Tribunal de Justiça de São Paulo, na qual a corte reforçou o entendimento da culpa exclusiva da vítima e isentou a instituição financeira. “A Justiça, no entanto, negou o pedido, afirmando que as instituições bancárias não têm a obrigação de tutelar seus clientes em toda e qualquer operação, ainda mais quando realizada pelo próprio titular da conta”, explica.

Stefano Ribeiro Ferri – Especialista em Direito do Consumidor. Assessor da 6ªTurma do Tribunal de Ética da OAB/SP. Membro da comissão de Direito Civil da OAB –Campinas. Formado em direito pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP)

CDC

Apesar das críticas, essas decisões não ferem o Código de Defesa do Consumidor (CDC), de acordo com o especialista. “Essas decisões não necessariamente contrariam o CDC, mas representam uma interpretação mais restritiva da responsabilidade objetiva prevista no artigo 14. O entendimento majoritário é que a responsabilidade do banco exige falha na segurança ou inadequação do serviço prestado”, informa Ferri.

Na prática, isso significa que o consumidor deve redobrar os cuidados, pois o ônus da prova tem recaído sobre ele. “Ele deve demonstrar que houve negligência, omissão, falta de segurança ou ausência de mecanismos de controle por parte da instituição financeira. Isso pode incluir, por exemplo, a não detecção de comportamento atípico na conta, falhas de autenticação ou ausência de confirmação em transações de alto valor”.

Essa movimentação dos tribunais, segundo o advogado, busca preservar a estabilidade do sistema financeiro, diante do crescimento alarmante de fraudes. “Essas decisões representam uma tendência de delimitação da responsabilidade dos bancos diante do avanço dos golpes digitais. Em parte, isso visa evitar um efeito sistêmico no setor financeiro, onde as instituições poderiam ser responsabilizadas por atos que ocorrem fora do seu alcance de controle”, diz Ferri.

Contudo, ele alerta que o excesso de proteção aos bancos pode gerar um efeito colateral perigoso. “Esse entendimento pode enfraquecer a confiança do consumidor, que já se vê vulnerável diante de golpes sofisticados. Ao mesmo tempo, o Judiciário busca equilibrar a autonomia do cliente nas operações bancárias digitais com o dever de segurança dos bancos”.

Quando o banco deve indenizar

Há, porém, situações em que o Judiciário reconhece o dever de indenização. Isso ocorre, por exemplo, quando há clonagem de cartão, vazamento de dados, falhas de autenticação, ou ausência de bloqueios preventivos.

“Quando o banco deixa de alertar ou de bloquear operações atípicas e incompatíveis com o histórico do cliente; o golpe envolve fraude sistêmica ou uso indevido da estrutura do banco, como invasão de conta, simulação de páginas do próprio banco ou falha no sistema de autenticação; o consumidor é vulnerável notório (idosos, pessoas com deficiência, analfabetos digitais) e o banco se omite diante disso”, finaliza Ferri.

Dicas para não cair em armadilhas digitais

>Desconfie de ofertas muito vantajosas ou que exigem pagamentos antecipados para vagas de emprego

>Nunca clique em links enviados por desconhecidos ou fora de canais oficiais

>Confirme ligações e mensagens com a fonte original (ex: ligar para o banco por outro número)

>Ative a autenticação em dois fatores nos aplicativos bancários

>Limite valores para transações via Pix, especialmente no período noturno

>Evite repassar dados pessoais por telefone ou mensagem, mesmo que a pessoa pareça confiável

>Cadastre chaves Pix apenas diretamente no app do banco e jamais por terceiros

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